Monday, May 28, 2007

Toulouse e Carcassonne


Há cerca de uma semana (num sábado) fui até Toulouse numa viagem que começou bastante atribulada. Fruto de excesso de trabalho, as checklists mentais que já estão mais que programadas e rotinadas não funcionaram lá muito bem. Vejamos:
- Esqueci-me no local de trabalho do bilhete de avião e voucher do hotel, o que fez que 1h 1/2 antes do voo tenha tido de ir buscar essa documentação ao escritório. Felizmente não fica muito longe do aeroporto.
- Não encontrei o carregador do telemóvel e o mesmo estava sem bateria. Novamente a ida ao escritório resolveu o problema.
- Quando cheguei a esse mesmo escritório lembrei-me que não tinha colocado umas calças na mala, o que para 4 dias era um pouco mau. Neste caso a loja da Springfield no aeroporto da Portela satisfez as minhas necessidades.
- Finalmente descobri pouco antes de sair de casa que a minha boleia tinha sido violentamente mordida e dissecada pelo seu gato raivoso e estava incapacitada de conduzir, o que me obrigou a levar o carro até ao escritório e aí o abandonar durante 5 dias.

Sem mais percalços cheguei a Toulouse via Madrid, pouco antes da hora de jantar. Debaixo de uma chuvada, lá consegui encontrar o caminho para o hotel, onde cheguei encharcado. Depois de mudar de roupa e me secar lá fui à procura de um sítio para comer. Entretanto o tempo melhorou e depois de comer uma chinezada dei uma pequena volta pela cidade e pelos sítio mais movientados como a praça do capitólio e a praça Wilson. A primeira impressão que fiquei foi bastante negativa, com a quantidade enorme de pedintes que vivem nas ruas, bem como a sujidade e o mau cheiro das mesmas. Entretanto descobri que neste dia era a noite dos museus e podia entrar à pala em todos. Parecia que a minha sorte estava a mudar, infelizmente Toulouse não é Paris ou Londres (ou mesmo Lisboa), o que rapidamente constatei após ver uns quantos calhaus no museu de St. Sernin e uns quadros medíocres numa galeria de arte que não me lembro o nome. Fui-me deitar.

Com o domingo todo para passear pela cidade, levantei-me, tomei o pequeno-almoço e pus-me a andar, com o céu nublado mas a temperatura bastante amena. Bastante movimento nas ruas, com inúmeros mercados ao ar livre e bastantes pessoas a fazer jogging ou a andarem de bicicleta. Muitos jovens, muitos imigrantes (principalmente do magrebe) e novamente muitos sem-abrigo. Muitas igrejas para visitar, não fosse este um ponto de passagem num dos caminhos de Santiago francês (nomeadamente o que liga Arles a Compostela). Cidade atravessada pelo rio Garonne e pelo canal du Midi, tem uma bela relação com a água, com muitos jardins e passeios à beira da água. As margens do rio Garonne oferecem os melhores sítios para um passeio relaxado ou para simplesmente descansar e ler um livro. Mais uma meia dúzia de edifícios interessantes e termina por aí. A oferta a nível de museus também não é vasta tal como tinha descoberto na noite anterior, o único sítio que acabei por achar interessante foi o Chateau d'Eau, com uma exposição de fotografia bem fixe.

Concluindo é uma cidade como tantas outras, pouco fascinante. Os highlights acabaram por ser pequenos pormenores, como a passadeira à beira do rio e um pequeno jardim japonês que encontrei um pouco por acaso, bem como a grande quantidade de jovens dá um ambiente descontraído e animado à cidade. Os pontos negativos são mesmo os problemas sociais e a degradação e sujidade da cidade.

Depois de uns dias de trabalho (sim, porque para haver diversão tem de haver trabalho) apanhei o TGV na quarta de manhã para Carcassone (cerca de 45min de viagem), uma bonita vila fortificada que remonta ao tempo dos romanos mas que foi praticamente toda reconstruida no sec. XIX. Bastante turística, mesmo a uma quarta-feira as hordas de japoneses e outras excursões eram mais que muitas. Felizmente cheguei lá muito cedo e consegui escapar um pouco a essa invasão e tirar algumas fotos. Perto da hora de almoço, farto de turistas e do calor de mais de 30º resolvi voltar a Toulouse, onde passei o resto do tempo a ver lojas (de preferencia com ar condicionado), antes de regressar a Portugal.

Fotos em http://lbaia.fotopic.net/c1286939.html

Friday, May 25, 2007

Um país em guerra com a água

Há uns tempos vi parte de um documentário sobre a Holanda e a sua geografia algo especial. Já tinha estado neste país uma meia dúzia de vezes mas nunca tinha saído das grandes cidades, Amesterdão e Roterdão. Desta vez resolvi explorar de carro, durante um fim de semana, o resto do país, e em particular os sítios que simbolizam essa luta que os holandeses sempre travaram contra o avanço das águas.

Na sexta depois de almoço saí de Schiphol em direcção a sul debaixo de uma chuva quase torrencial acompanhada de um forte vento. Estas duas situações meteorológicas, muito usuais por estas bandas e que fazem com que a Holanda seja conhecida como o país da chuva horizontal, aliadas ao facto de 70% do país se encontrar abaixo do nível do mar (só por curiosidade, o aeroporto de Schiphol está 4m abaixo do nível do mar, bem como Amesterdão), faz com que ao longo dos anos inúmeros diques e barragens tenham sido construídas para travar as constantes inundações.

Devido à chuva não pude parar no Keukenhof Garden, o maior jardim de flores do mundo (a Holanda também é o país das tulipas). Continuei para sul até a província de Zeeland, e felizmente a chuva parou. Em Fevereiro de 1953, uma maré viva e uma forte tempestade no mar do Norte fez com que os níveis das águas do mar subissem 5,6m. Os diques existentes não conseguiram suster o avanço das águas e o resultado foram 1835 mortos e 70000 pessoas evacuadas. As inundações cobriram 10% da superfície do país, tendo ainda destruído 10000 edifícios e morto 30000 animais. Nasceu depois disso o Delta Project, um conjunto de diques e barragens para proteger contra estas situações. A minha primeira paragem foi no Oosterscheldekering (nome simpático), a maior destas barragens e que cortou o mar no sul do país. É uma obra de engenharia impressionante, com cerca de 15km e por onde passa uma autoestrada, foi criado um lago artificial.

Continuei a minha viagem até à pousada de juventude de Dordrecht, onde iria dormir nessa noite. Quando lá cheguei fiquei contente porque a pousada ficava no meio dum parque natural (o Biesbooch) e estava quase vazia, o que fez com que ficasse sozinho numa camarata assim não tendo de tirar para fora os tampões para os ouvidos, indispensáveis nestas situações. Depois de um jantar um pouco atribulado, em que fui obrigado a devolver uma perna de frango, resolvi ir dar um passeio junto ao lago. Terminar o dia a ler um livro junto a um lago, ouvindo os pássaros cantar é um daqueles prazeres inigualáveis.

No sábado acordei cedo mas uma forte chuvada manteve-me na cama mais algum tempo, mas deixou-me preocupado pois os meus planos implicavam um dia extenso. Por fim a chuva amainou e pus-me a caminho. Uma das razões porque resolvi ficar nesta zona foi por causa dos moinhos de Kinderdijk, 19 no total, construídos no séc. XVIII para drenar as águas da zona, e que inspiraram inúmeros quadros dos mestres holandeses como o Van Gogh. Fotografar estes moinhos com esses quadros na mente era o meu objectivo. O tempo cinzento não ajudou, ainda assim foi uma sessão produtiva.

Após os moinhos segui para norte pelo lado esquerdo do lago Idjsell, mais um criado artificialmente umas dezenas de anos atrás. Pelo caminho passei por pequenas aldeias como Edda, famosa pelo seu queijo, que com os seus canais faz lembrar Amesterdão em ponto pequeno. Ao longo da estrada a água é constante, não apenas a da chuva, mas pelos inúmeros canais, lagos, rios e diques, entre outros, que povoam os campos, bastante cultivados e cheios de animais. Atravessei para o outro lado do país por um enorme dique que foi o responsável por criar o tal lago Idjsell, não sem antes ter de parar o carro para se abrir um canal e deixar passar para o mar um conjunto de barcos.

Já no lado direito do lago, na província de Friesland, cheguei à estação de extracção de água de Wouda. Construída em 1920, é a maior estação a vapor do mundo e ainda se encontra em funcionamento. Com direito a uma visita guiada gratuita e personalizada (pois era o único não holandês), se tivesse prestado atenção em vez de tirar fotos poderia aqui descrever o funcionamento das dezenas de motores, pistões e válvulas. Mas assim apenas posso dizer que extrai água de um sítio para outro... e que funciona a gás em vez do original carvão.

Como não estava à espera de visita tão demorada pouco mais tempo tive durante a tarde, indo directamente para a pousada da juventude de Apeldoorn. Apesar de também se encontrar no meio de um parque natural, esta estava cheia de putos do secundário, bebendo cerveja e cantando karaoke enquanto os professores viam o festival da eurovisão, e depressa percebi que teria de partilhar a camarata com mais duas pessoas. As pousadas da juventude são baratas, asseadas, e até uma boa maneira de conhecer pessoas, mas a comida não é o seu forte, muito pelo contrário. Como tal, peguei no carro e fui comer e beber que nem um alarve num restaurante mexicano no meio da cidade, não sem antes ter uma guerra aberta com o GPS, que embirrava em me enviar para becos sem saída. Regressei ao hostel, li o meu livrinho, ainda fui gozado pelos professores dos tais estudantes pelo facto de Portugal não estar na final da Eurovisão (o que me deixou muito triste, ou não) e fui-me deitar, desta vez com os tampões nos ouvidos.

No último dia deixei para trás os moinhos, diques, barragens e afins e resolvi dar uma de turista mais convencional. Fui para o parque natural de De Hoge Veluwe, usei uma das bicicletas que o parque fornece gratuitamente e feliz da vida pedalei cerca de 20km durante a manhã toda, através de um bosque com inúmeros lagos, passando por um museu de arte contemporânea com um muito engraçado jardim de esculturas.

Depois de almoço e antes de ir para o aeroporto um saltinho ao palácio de Heit-Loo, residência de férias dos reis holandeses, do estilo do palácio do Queluz, mas mais fraquinho, na minha opinião.

Fiquei com a impressão que a Holanda se divide entre Amesterdão com as suas coffee-shops e o bairro da luz vermelha, símbolos de um país considerado dos mais tolerantes da Europa, e o resto do país, muito mais virado para a natureza, para o campo e para a água, e conservador como o resto da Europa.

Fotos em: http://lbaia.fotopic.net/c1286906.html